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Senhor do Corpo Santo
Senhor do Corpo Santo A Igreja de São Pedro Gonçalves ou do Corpo Santo, no Recife, foi demolida em outubro de 1913. Era igreja velha, já no tempo dos holandeses.
Todas as relíquias, objetos do culto, alfaias, púlpitos, colunas, foram guardados na Igreja da Madre de Deus.
E veio também o Senhor do Corpo Santo, imagem impressionante do Senhor Bom Jesus dos Passos, alto, sombrio, macerado, com as manchas roxas de sangue coagulado, assombroso pela naturalidade e grandeza trágica.
Outrora o Senhor do Corpo Santo, na procissão soleníssima dos Sete Passos, saía da sua igreja, na antepenúltima quinta-feira da Quaresma, para o Convento do Carmo, e daí regressava, com acompanhamento, cumprindo um ato litúrgico, que não está nos rituais, mas vivia na praxe secular.
Era a imagem mais sugestiva e possuidora das admirações populares.
Ninguém sabe quem a esculpiu nem a época em que apareceu. Dizem que, numa noite de frio e chuva áspera, clareada de relâmpagos e sonora de trovões, pleno fevereiro de inverno recifense, o frade leigo que estava como porteiro no Convento do Carmo ouviu bater repentinamente à porta.
Abriu-se e deparou um velhinho encharcado, humilde, trêmulo, com uma voz extremamente doce e triste, suplicando agasalho por uma noite.
O porteiro, zangado com o atrevimento, recusou hospedagem e mandou-o dormir na rua ou debaixo das pontes.
E fechou o portão.
O velhinho lá se foi, cambaleando, arrimado a um bordão, até a igreja de São Pedro Gonçalves, onde bateu. O porteiro-sacristão atendeu. Novo pedido, com voz expirante.
O porteiro, compadecido, fez o velho entrar, deu-lhe o que comer e com que se enxugar, e indicou um recanto na sacristia onde poderia agasalhar-se e dormir, em cima de um colchão.
Pela madrugada, o sacristão foi acordar o velho, levando uma esmola de despedida.
Não o encontrou. Enchia o colchão uma maravilhosa imagem do Senhor Bom Jesus dos Passos, vestida de seda lilás, com resplendor de prata, tão rica, imponente e poderosa de semelhança divina, que o sacristão dobrou os joelhos, contrito.
Quando se espalhou o sucesso, verificado pelo povo que o velhinho fora o próprio Senhor do Corpo Santo, os frades do Carmo penitenciaram-se, sem culpa maior, pela falta de hospitalidade manifestada pelo irmão leigo da portaria.
E como o Senhor do Corpo Santo procurara primeiramente o Convento do Carmo, alegaram que tinham direito à posse da imagem.
Os padres da Igreja de São Pedro Gonçalves retrucaram, e o caso foi a juízo, com debatido, longo e verboso processo, tornados tão volumosos os tomos da demanda, que eram transportados num jumentinho.
Mas a Igreja de São Pedro Gonçalves ganhou o pleito, cedendo apenas ao Convento do Carmo a honra de hospedar o Senhor do Corpo Santo por uma noite, a noite que fora recusada ao velhinho misterioso e de fala triste.
A Igreja do Corpo Santo, outrora rutilante de luzes, desapareceu, arrasada pelos engenheiros que desejavam ampliar a cidade.
A Igreja da Madre de Deus maternalmente acolheu o Senhor do Corpo Santo numa de suas salas.
E lá continua, sem mais ter volvido a cumprir a tradicional visita ao Convento do Carmo.
Se o olhar, sombrio na majestade do seu sofrimento e de sua solidão litúrgica, reze três “ave-marias”, uma delas por mim.
Amém.


Fonte : Lendas Brasileiras / Câmara Cascudo. - Rio de Janeiro: Ediouro, 2000


Senhor do corpo santo

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