O tupi que o Brasil fala hoje
Assim
como o latim e o grego, o tupi antigo
participou decisivamente do português que é falado no Brasil.
Assim, mesmo sem saber, não existe brasileiro que não conheça
alguma palavra desse idioma. Que não saboreie abacaxi, pitanga,
caju, jaboticaba, sapoti, gravatá ou pequi, frutas que conservaram
seus nomes nativos. Ou que jamais tenha ouvido cantigas folclóricas
como “Eu fui no itororó beber água e não achei. Achei
bela morena, que no itororó deixei” —, mesmo desconhecendo que itororó
é uma palavra indígena que significa bica d’água.
Leia a seguir mais alguns exemplos, extraídos do Método Moderno
de Tupi Antigo, livro do professor Eduardo Navarro:
“Reparando bem, todo mundo tem pereba,
só a bailarina que não tem”, diz uma música de Chico
Buarque de Holanda. Pereba, do
tupi, significa ferida.
·
Pare com este nhen-nhen-nhen.
A expressão vem do verbo nhe’eng
(falar, piar) e significa
pare de ficar falando, de falar sem parar.
·
O velho jogo de peteca, que é
um pequeno saco cheio de areia ou serragem sobre o qual se prendem
penas
de aves, tem este nome devido ao verbo petek
— golpear ou
bater com a mão espalmada. É com a palma da mão que
se joga o brinquedo.
·
Velha coroca é uma velha
resmungona. O termo nasceu do verbo kuruk,
que significa
resmungar.
·
O verbo cutucar, em português,
origina-se do tupi kutuk, cujo
significado original — furar,
espetar — modificou-se ligeiramente. Em português, cutucar é
tocar com a mão ou com o pé.
·
Estar jururu é estar melancólico,
tristonho, cabisbaixo. O termo indígena aruru,
de
onde surgiu a palavra, tem o mesmo sentido.
·
Várias palavras mantiveram pronúncia
e significado praticamente originais: mingau (papa
preparada geralmente
com farinha de mandioca), capim, mirim
(que significa pequeno)
e socar (do verbo sok,
com o mesmo significado).
·
A expressão estar na pindaíba
muito brasileiro conhece: significa estar em graves dificuldades
financeiras.É
uma expressão que vem das palavras pinda’yba
— vara
de pescar (pindá, isoladamente, significa anzol).
Antigamente,
quando a pobreza abatia as populações ribeirinhas, era comum
se tentar tirar a subsistência do rio, pescando para comer ou para
vender o pescado. Segundo os pesquisadores, a expressão nasceu no
período colonial brasileiro, em que o tupi em sua forma evoluída
conhecida como “língua geral” era falado pela
maioria dos
brasileiros.
· A perereca recebe esse
nome simplesmente
porque ela pula. Vem do verbo pererek,
pular, que é
também a origem do Saci-Pererê que, por não ter uma
perna, anda aos pulos.
Eduardo de Almeida
Navarro, professor da Faculdade de Letras da USP.
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