Terra Brasileira
Brasil Folclórico
folclore
modus Transporte
artesanato culinária
literatura Contos lendas mitos
música danças religiosidade tipos ofícios contatos
Loja
Modus
O Nascimento
-O Couvade
-O Sexo do bebê
-O Recém-nascido
-A Escolha do nome
-O Batizado
-O Cheiro
A infancia
Jogos e Brinquedos
O Jovem
O Casamento
O Habitar
Direção do lar
O Adulto
O Idoso
A Morte
Sabedoria Popular
Crendice

O Recém-nascido

Os Primeiros cuidados com o bebê
Um bebê nascido na época elizabetana era inteiramente enfaixado em tiras largas. Para auxiliar a dentição, sugava uma chupeta de coral embebida em suco de cenoura e, para afastar os demônios, havia sempre um chocalho de prata pendurado no berço. Através de um chifre de boi o bebê recebia alimentação.

Este costume, de enfaixar o bebê, foi comum no Brasil até meados do século passado.
Para a criança, logo após o nascimento dá-se uma colherinha de óleo de amêndoa, o que é sempre indicado pela parteira. Lavada a criança é a seguir vestida e a roupa usada é a seguinte: uma camisa, um casaquinho de flanela quando nasce na época de inverno, sapatinhos de lã, touca ou não. Geralmente as toucas são feitas com meia de algodão de mulher. Para enrolar as pernas das crianças usa-se pano, trapos.
Bebê
Mulher Kulina
Mulher Kulina carregando filho nas costas, no trabalho de coleta

Durante os dois primeiros anos, a criança indígena fica permanentemente sob os cuidados da mãe ou avó, descansando na faixa de algodão amarrada às costas da mãe. Nesta posição ela recebe o alimento e acompanha sua mãe em todos os lugares: de manhã e à tarde é banhada no rio; durante a manhã acompanha a mãe na plantação, e até a bailes, dormindo dentro da faixa. A vida da criança transcorre sem violência. Não há serviçais. A vida do grupo estimula a cooperação e a solidariedade. Quando uma das crianças ganha um pedaço de chocolate, imediatamente divide-o com outras, mostrando a assimilação de tais valores. A tranqüilidade das crianças e a ausência de brigas são também reflexos do modo de vida dos indígenas, que jamais alteram a voz ou fazem recriminações.

A tipóia – o menino carregado às costas da mãe - é traço que se perdeu nos costumes brasileiros; só se explicava, aliás, pela atividade extra-doméstica da mãe indígena. Vingou com o complexo da rede, o costume de rede-berço, que só agora vai desaparecendo das tradições do norte: muito nortista ilustre, hoje homem feito, terá sido criado ainda em rede, embalada pela mãe ou pela ama negra.

Jean de Léry (1880) ficou encantado com a higiene infantil e doméstica dos indígenas. Contrasta-a com a dos europeus. E conclui pela superioridade do processo americano. O menino crescia livre de fraldas, cueiros e panos que lhe dificultasse os movimentos. Mas não implicava essa liberdade em descuido das mães. Sua limpeza e asseio impressionaram o observador francês.

Ao punho da rede os indígenas associavam as primeiras cerimônias em torno do nascimento do filho: aí penduravam, no caso de ser macho o recém-nascido, um arco com flechas e “molhos d'ervas”. Através da infância continuavam as medidas preventivas da criança contra as influências malignas: “têm muitos agouros, porque lhes põem algodão sobre a cabeça, perna de pássaros e paus, deitão-nos sobre as palmas das mãos, e roção-nos por ella para que cresção”.
O corpo era pintado de urucu ou jenipapo: os beiços, o septo, as orelhas perfuradas; batoques, fusos, penas enfiadas nesses orifícios, dentes de animais pendurados ao pescoço. Tudo para defigurar, mutilar a criança, com o fim de torná-las repulsiva aos espirítos maus, guardá-las do mau-olhado e das más influências.
Algumas dessas preocupações profiláticas, disfarçadas às vezes ou confundidas com motivos decorativos e devotos, permanecem em torno da criança brasileira. No norte ainda é comum ver meninos cheios de tetéias penduradas ao pescoço – dentes de animais, figas de madeira ou de ouro, bentos e medalhas católicas, mechas de cabelo. Aliás o costume, entre as famílias mais devotamente católicas do norte e do centro do Brasil, de ofertar os cachos ou a cabeleira do menino, quando atingida a idade de cortar-lhe o cabelo rente, à imagem do Senhor dos Passos ou do Senhor Morto, talvez sobreviva aquele receio ameríndio do cabelo, dos dentes ou das unhas do indivíduo, principalmente da criança, servirem de objeto a práticas de feitiçaria ou de magia. Que melhor meio de evitar semelhante risco que o de oferecer ao próprio Jesus o cabelo da criança?

Além dos cuidados de ordem material que são dispensados à criança há outros, de ordem espiritual que poderíamos chamar de ritos protetivos: no caso de qualquer doencinha, soluço, quebranto, mau olhado, imediatamente a mãe corre procurando a “benzinheira” ou ela mesma executa certas práticas simpáticas capazes de debelar o mal. Ritos protetivos que acompanham a criança até adulto, porque ai nessa fase da vida vai praticar os ritos produtivos.
Dentre os ritos protetivos mais comuns se destaca o benzimento que é feito por uma “benzinheira”. Esta, em geral, é a própria parteira, a “assistente” que os executa. Aliás, há muitas práticas que são observadas porque as “assistentes”, já ao penetrarem na casa, as vem executando: meizinhas, chás, óleos bentos, gotas de água benta que se vai buscar na igreja, são os remédios eficazes para os males infantis. Há um cego pedinte de feira, que é o mais procurado benzedor de crianças que estejam com bichas assustadas. As mães sempre alertas para evitar os males da primeira infância: “mau olhado”, “ventre caído”, “mal dos sete dias”, olhado nas tripas”, “ar do tempo”, etc., aliás, doenças todas curadas por meio de simpatias, rezas, etc.

O Umbigo
O umbigo é cortado tendo como medida dois dedos, amarrando-se duas vezes com cordão unto. O cordão é encerrado, passado no sebo de carneiro. Em seguida limpa-se bem, com um algodão colocando-se talco sem perfume, talco Ross como faziam também antigamente.
A tesoura que foi utilizada para cortar o umbigo costumam colocar debaixo da cama. Ou fica espetada, aberta num rolo de fio que deve ser colocado à cabeça da criança na cama. Isto impede que a criança sofra complicações no umbigo. Este após ter caído costuma-se enterrar na porteira do curral (para ter sorte na fazenda com plantação ou gado), na igreja (para ser religioso) ou lançado ao rio (para ter sorte nas cousas ligadas ao rio).
O umbigo é tratado com óleo de amêndoa. Após ter caído usa-se a canela em pó. Hoje usa-se também o Anaseptil. O paninho usado deve ser lavado anteriormente e passado. Depois com o auxílio de uma vela, faz-se um furo no centro a fim de colocar, através dele, o umbigo. Antigamente usava-se o óleo bento que se ia buscar na igreja.
O cordão utilizado hoje é comprado na farmácia. Antes tomava-se um cordão enrolando-o a fim de que ficasse mais forte, mais resistente.
Cuidado com o rato porque diz o povo, caso este roa, a criança se tornará ladra. Assim quando uma pessoa é presa por roubo logo dizem “o rato roeu o umbigo dele”.

Na época colonial, o bebê tinha seu corpo enfaixado e a cabeça modelada a fim de ganhar uma forma mais agradável. Entre os descendentes de africanos e entre algumas tribos indígenas, achatavam-se os narizes dos pequeninos para atender a critérios de estética. Em certas regiões da colônia, as mães secavam os umbigos com pimenta e óleo de rícino. Em outras, elas tratavam com “uns paninhos de linho fino”. Mais tarde os paninhos seriam substituídos por “óleo de amêndoas doces ou azeite”, e, ao cair o umbigo, pulverizavam com “pó de murta ou casca de romã até fazer uma cicatriz perfeita”. Para fortificar a cabeça da criança, usava-se a “estopada”: “um cataplasma que é mistura de um ovo com vinho na qual se ensopa uma estriga de linho e com ela se cobre a cabeça, atando-a por um lencinho”.
Da Metrópole vinham sugestões de que o “vestuário do mínimo” e compunha apenas de “uma camisinha, um roupãozinho de lã ou fustão, uma touquinha de seda branca e macia de ser atada”. Enquanto a criança não andasse , “escusava calçado”. Além do leite de peito considerado pelos médicos “extremado remédio”, era comum engrossarem-se os alimentos das crianças com farinha, ou ainda dar-lhes “alimentos grosseiros tirados da própria comida”, como ocorria sobretudo entre as africanas.
Uma rede imaginária cercava a pequena criança de perigos. Acreditava-se que as bruxas tinham poder de atrofiar os recém-nascidos por malefícios, pois “elas chupam o sangue dos mínimos”, não convindo, portanto, deixá-los a sós, à noite. Para protegê-los, cabia defumar a casa e a cama, e espalhar arruda e hipericão entre os lençóis. Os cômodos deviam ser lavados com verbenas e com a mesma água borrifavam as crianças. Misturando o sacro e o profano, recomendava-se aos pais que se armassem com “os antídotos da igreja, a saber, relíquias, orações que estas são mais certas e seguras que outras que trazem os autores para afugentar os bruxos”. Na cama dos pequeninos cabia pendurar “cabeça e língua de cobra” e, pela casa, espalhar o fel da mesma. As mães reconheciam o enfeitiçamento por “medos e tremores amiúde, choros repetidos, tristeza de aspecto, mudanças de cor, repugnância em mamar, vergões ou nódoas em algumas partes”. Na dúvida, existiam algumas maneiras de reconhecer se havia “quebranto” sobre a criança. Bastava tomar “um vaso cheio de água e posto debaixo dos cueiros e faixas dos mínimos ou dos berços e metendo-lhe dentro um ovo, e se este andar nadando é certo haver quebranto”.

Amamentação

Ama-de-leite

De Portugal transmitira-se ao Brasil o costume das mães ricas não amamentarem os filhos, confiando-os ao peito de saloias ou escravas. Júlio Dantas, nos seus estudos sobre o século XVIII em Portugal, registra o fato: “o precioso leite materno era quase sempre substituído pelo leite mercenário das amas”. O que atribui à moda. Com relação ao Brasil, seria absurdo atribuir-se à moda a aparente falta de ternura materna da parte das grandes senhoras. O que houve, entre nós, foi impossibilidade física das mães de atenderem a esse primeiro dever de maternidade. Elas se casavam todas antes do tempo; algumas fisicamente incapazes de ser mães em toda a plenitude. Casadas, sucediam-se nelas os partos. Um filho atrás do outro. Um doloroso e contínuo esforço de multiplicação. Filhos muitas vezes nascidos mortos – anjos que iam logo enterrar em caixõezinhos azuis. Outros que se salvaram da morte por milagre. Mas todos deixando as mães uns mulambos de gente.
Deve-se atribuir a importância, em nossa organização doméstica, da escrava ama-de-leite, chamada da senzala à casa-grande para ajudar franzinas mães de quinze anos a criarem os filhos. A tradição brasileira não admite dúvida: para ama-de-leite não há como a negra.

Ilustração da capa de Casa-Grande & Senzala em quadrinhos / Gilberto Freyre; desenhos de Ivan Wasth Rodrigues;


Fontes : Escorço do folclore de uma comunidade  – Alceu Maynard Araújo in Revista do Arquivo Municipal CLXVI – Departamento de Cultura da Prefeitura do município de São Paulo, 1962
Os rituais do nascimento in Livro da Vida, Vol 1 - São Paulo: Abril S.A. Cultural e Industrial, 1974.
História da Vida Privada no Brasil 1 : cotidiano e vida privada na América Portuguesa / organizada por Laura de Mello e Sousa. - São Paulo: Companhia das Letras, 1997
Casa Grande e Senzala / Gilberto Freyre - São Paulo: Círculo do Livro S. A., s/ data.
Mulher Kulina: foto de Heiner heine, publicada em Brasil Indigena 500 Anos de Resistência / Bendito Prezia, Eduardo Hoornaert. - São Paulo: FTP, 2000.
Gif animado da Animationfactory


Volta ao Topo
Deixe seu comentário: Deixe seu comentário:
Correio eletrônico Facebook
Livro de visitas Twitter