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Os
barracões construídos no morro da Providência, perto da Estrada de
Ferro Central do Brasil, para abrigar os soldados que voltaram ao Rio,
depois da campanha, chamados "favelas" pelo povo, foram, depois de seu
retorno aos quartéis, vendidos e alugados à população pobre da cidade,
passando o morro a chamar-se Favela, tal como o seu homônimo baiano. Em
seu livro Habitações Populares publicado pela Imprensa Nacional em 1906
o então engenheiro da Prefeitura EVERARDO
BACKHEUSER,
chama a atenção para o problema surgido - a procura desse morro pela
população da cidade, que o buscava em virtude de demolições de casas e
abertura de ruas realizadas com o fim de, zelar pela higienização e
embelezamento da mesma. O problema é, pois, antigo e o nome favela
tornado substantivo comum, é encontrado nos dicionários como "conjunto
de habitações populares, toscamente construídas e desprovidas de
recursos higiênicos".
Desenvolvida entre planícies e apertada entre morros, a cidade cresceu ocupando aquelas e fugindo a esses; o morro foi deixado de lado enquanto a habitação não constituiu problema que alarmasse o carioca. Chegou, porém, o momento em que parte da população da cidade foi obrigada a se amontoar em hotéis, pensões e casas de cômodo, enquanto outra parte, a menos favorecida, passou a subir os morros, neles estabelecendo agrupamentos de casas a que denominamos favelas. Esses casebres, que abrigam os elementos mais pobres da população da cidade, não se restringem mais, entretanto, aos morros da Mangueira, da Providência, do Cantagalo, mas, zonas planas, abandonadas ou ainda desocupadas, veem repentinamente aparecer e como que se multiplicar, as favelas, tanto mais numerosas quanto maior a facilidade de transporte. Nos morros nota-se maior concentração nas partes mais baixas, rareando as construções à medida que se vai subindo. As favelas surgem ocupando terrenos "de ninguém", da Prefeitura ou da União e, muitas vezes, em terrenos alugados. Há casos de grandes áreas, pertencentes a particulares, serem divididas e alugadas. Cada parte é novamente dividida e alugada a terceiros que, após nova divisão, começam a construir os "barracos" para alugar. Aproveitando restos de prédios demolidos, os "construtores" erguem-nos da noite para o dia. Outras vezes é o próprio dono o construtor do "barraco" em que mora, e que ele procura melhorar e aumentar na medida de suas possibilidades. Os barracos são, de modo geral, construídos de tábuas de caixote e pedaços de lata, havendo-os, também de sopapo; a cobertura de folhas de zinco ou, ainda, de lata, é protegida por grandes pedras que a impedem de voar quando o vento é forte. Sobre o chão de terra é usualmente colocado um estrado de ripas de madeira, que isola a cama ou o que lhe faz as vezes, entre os menos favorecidos. Uma porta e uma janela arejam e permitem o acesso ao barraco que parece, por vezes, enterrado no chão, sendo necessário vergar-se um pouco a cabeça para nele penetrar. No mesmo cômodo que serve de quarto, em geral escuro devido à fumaça, a um canto há uma pequena mesa sobre a qual é colocado o fogareiro de carvão. Pendurados à parede ou em pequenas prateleiras, ficam os utensílios de cozinha, misturados com réstias de cebola, retratos e imagens de santos. Um ou outro barraco possui duas peças - sala e quarto, vendo-se de vez em quando um mais bem arranjado, tendo armário de roupas, mesa e até rádio. São, porém, desprovidos das menores exigências de conforto e higiene, não possuindo água (a não ser a da chuva que entra pelas frestas), nem sistema de esgoto. Os barracos amontoam-se uns ao lado dos outros, deixando entre si espaços exíguos que constituem ruas, nas quais existem, de modo geral, vala onde é jogada a água, restos dos despejos caseiros e onde pululam mosquitos. A água é problema sério para o favelado. Quando existem bicas, a população faz filas para encher as latas e levá-las para casa. As vezes, um poço ou uma "mina", nas favelas situadas em morros, torna-o menos premente. A luz é também obtida de maneira interessante; certos indivíduos conseguem para si instalação elétrica; estabelecem, porém, uma cabina para redistribuição de força a 200 ou 300 casas, cobrando uma quota pelo "benefício" prestado. Acontece, porém, que, em virtude da instalação deficiente, há sempre necessidade de consertos, sendo obrigados a contribuir para os mesmos os "beneficiados". As favelas possuem vida inteiramente à parte do resto da cidade. A luz e a água são, como vimos, obtidas de maneira sui generis. Elas possuem até mesmo casas de negócio, as "biroscas", espécies de armazéns que vendem sem pagar impostos, açougues, casas de ferragem e até consultórios médicos. Algumas vezes os habitantes promovem bailes, cuja entrada é cobrada mesmo às mulheres, com o fim de financiar escolas e postos de assistência social dirigidos por eles próprios e que servem a interesses de terceiros. E é nessas condições que vivem, segundo as estatísticas, 280 0001 habitantes da cidade do Rio de Janeiro, sendo metade desta cifra constituída de crianças que, em geral, não frequentam escolas nem possuem registro civil. Cada um daqueles barracos abriga famílias compostas de duas a onze pessoas" gente humilde e sem ambição, vivendo inteiramente à margem da sociedade. Notas: 1 - Pesquisa divulgada pelo Instituto Data
Favela, de 2014, revela que os habitantes das favelas do Rio de
Janeiro, somam
dois milhões de moradores. Atualmente as casas das favelas são
construídas de madeira ou alvenaria. Ainda com muitos problemas de
infraestrutura (rede de esgoto, de abastecimento de água, de energia,
de posto
de saúde, de coleta de lixo, de escolas, de transporte coletivo etc.) A partir de 1980 as favelas vêm passando por
uma política de urbanização e a integração desses espaços à cidade fez
surgir o
termo "comunidade", como forma de amenizar o estigma da palavra
favela. |
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