As
Carpideiras
Não
tivemos, no Brasil, a carpideira profissional, chorando o defunto
alheio,
mediante pagamento. Foram conhecidas em quase toda a Europa, e a
tradição
de chorar, cantar, dançar e ter uma refeição dedicada
aos mortos é possivelmente universal e milenar.
Para
nós do Brasil, indígenas e africanos escravos usavam a mesma
prática, mas recebemos dos portugueses a carpideira espontânea,
lamentando o defunto gratuitamente e vocacionalmente, ou tendo lembranças
de alimentos, dinheiro, roupas, em recompensa da mágoa colaborante
e ruidosa.
Ainda
resiste o chorar o defunto no interior brasileiro,
executado por
velhas ligadas por laços de parentesco, amizade ou sedução
trágica, diante do cadáver, excitando as lágrimas
da família com frases exaltadas e gesticulação inimitável
e dramática. São elas, fazendo o quarto ao defunto,
guarda, sentinela, velório, as iniciadoras do canto das Incelências,
Excelências, entoadas com a voz mais sinistra e apavorante, embora
de impressão inesquecível para a assistência. São
sabedoras das rezas de defunto votivas. Essas
orações
e cantos das Excelências duram até o saimento do
enterro.
Há
nessas localidades, velhas de fama ilustre, indispensáveis no
cerimonial
popular, de irresistível provocação para o pranto.
Não se compreende defunto sem choro, índice de
suprema
indiferença e abandono total.
No túmulo
de Minnakht, em Tebas, 1500-1450 a. C., e oito séculos antes que
Roma fosse fundada, estão as carpideiras do Egito. Os romanos
divulgaram
oficialmente a indispensabilidade ritual das carpideiras, dividindo-as
em duas classes: a Prefica, paga para cantar os
louvores do morto,
e a Bustuária, que acompanhava o cadáver ao local
da incineração, pranteando-o estridentemente, segunda a tabela
dos preços.
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