- Calma, Mariazinha,
consolou o irmão.
Você não precisa ficar preocupada. Eu darei um jeito.
E, depois que os pais adormeceram, ele
levantou, vestiu seu casaquinho, abriu a porta e, sem fazer barulho.
Saiu. O luar estava claro e iluminava as pedrinhas de cascalho diante
da casa, que brilhavam como diamantes.
Joãozinho se abaixou e encheu
seus bolsos com as pedrinhas. Depois voltou para casa e falou para
Mariazinha:
- Você não tem nada a
temer, querida irmãzinha, durma tranquila. Deus não nos
abandonará.
E deitou-se novamente em sua cama.
Quando o dia começou a amanhecer, mesmo antes do nascer do
sol, veio a mulher e acordou as duas crianças.
- Levantem, seus
preguiçosos, nós
vamos à floresta buscar lenha.
Então deu a cada um, um
pedacinho de pão e falou:
- Isto é o que vocês têm
para o almoço, mas não comam logo, pois nada mais
ganharão.
Mariazinha guardou o pão no
avental, pois Joãozinho tinha guardado as pedrinhas no seu
bolso. Depois disso, foram todos juntos para a floresta. Após
terem andado um pouco, Joãozinho parou, olhou para trás
em direção da casa, repetindo esse gesto várias
vezes. O pai então, lhe perguntou:
- Joãozinho, por que você
está olhando tanto para trás e assim se distancia de
nós? Distraia-se menos e trate de andar mais depressa.
- Ah, pai, respondeu ele, estou me
virando para ver o meu gatinho branco, que está sentado em
cima do telhado, e quer me dizer adeus.
A mulher contestou:
- Seu tolo, não é o seu
gatinho, é o sol da manhã que está brilhando
sobre a chaminé.
Mas Joãozinho não estava
se virando para olhar o gatinho, mas sim para jogar as pedrinhas e,
com isso, marcar o caminho de volta.
Quando chegaram no meio da floresta, o
pai disse:
- Vão juntar lenha, crianças,
eu vou acender uma fogueira para que vocês não fiquem
com frio.
Joãozinho e Mariazinha apanharam
gravetos até formar uma pequena pilha. A fogueira foi acesa e,
quando as chamas já estavam altas, a mulher recomendou:
- Cheguem-se mais para perto do fogo,
crianças, e descansem, nós vamos cortar madeira. Quando
estivermos prontos, viremos buscá-los.
Joãozinho e Mariazinha ficaram
sentados diante do fogo e, ao meio-dia, cada um comeu o sei pedacinho
de pão. E, como ouviam as batidas do machado, acreditavam que
seu pai ainda estivesse por perto. Mas não era o machado e sim
um galho que o lenhador tinha amarrado numa pequena árvore, e
que o vento fazia bater de um lado para o outro. Depois de ficarem
sentados assim por muito tempo, seus olhos se fecharam de sono, e as
crianças caíram em sono profundo.
Finalmente, quando acordaram, já
era noite escura. Mariazinha começou a chorar e falou:
- Como vamos conseguir sair desta
floresta?
Mas Joãozinho a consolou,
dizendo:
- Espere um pouco até que apareça
a lua e, então acharemos o caminho de volta para casa.
E, quando a lua surgiu no céu,
Joãozinho tomou sua irmãzinha pela mão e seguiu
o caminho marcado pelas pedrinhas, que brilhavam e lhes indicavam o
rumo de volta. Caminharam a noite inteira e, ao raiar do dia,
chegaram à casa do pai.
Bateram na porta em quando a mulher
abriu e viu que eram Joãozinho e Mariazinha, exclamou:
- Seus malvados, por que vocês
dormiram tanto tempo na floresta? Nós pensamos que vocês
não queriam mais voltar.
O pai ficou feliz, pois mão se
conformara de ter abandonado os filhos na floresta.
Algum tempo depois, a miséria
voltou a assolar o país, e as crianças ouviram quando,
à noite, a mulher voltou a se queixar ao marido:
- Já não há mais
comida alguma. Só temos ainda um pedaço de pão,
depois estará tudo acabado. As crianças têm que
ir embora, nós os levaremos ainda mais longe na floresta, para
que não tornem a achar o caminho de volta; do contrário,
não haverá salvação para nós.
O infeliz pai não queria
concordar e pensou: “Seria bem melhor se eu dividisse o último
pedaço de pão com meus filhos”. Mas a mulher,
discordando do que o lenhador propunha, começou a insultá-lo,
lembrando que, se ele já tinha concordado uma vez, deveria
fazê-lo novamente.
Como as crianças ainda
estivessem acordadas, ouviram a conversa dos pais. Quando os velhos
adormeceram, Joãozinho novamente levantou e procurou sair para
juntar pedrinhas como da primeira vez, mas a mulher tinha trancado a
porta, e assim ele não pode sair. Apesar disso, consolou sua
irmãzinha, tranquilizando-a:
- Não chore, Mariazinha, durma em
paz, Deus nos ajudará.
Ainda de madrugada veio a mulher e
tirou as crianças da cama. Estas receberam seu pedacinho de
pão, ainda menor que o da vez anterior. No caminho para a
floresta, Joãozinho começou a esfarelar o pão no
bolso, jogando as migalhas de longe em longe.
- Joãozinho, por que você
pára e põe-se a olhar para trás? Perguntou o
pai. Vamos siga o caminho!
- Estou olhando para a minha pombinha
que está no telhado, querendo me dizer adeus, respondeu o
menino.
- Tolo, disse a mulher. Não é
sua pombinha, é o sol que está nascendo e brilha na
chaminé.
Joãozinho, aos poucos, foi
jogando todos os farelos de pão pelo caminho.
A mulher levou as crianças mais
para dentro da floresta, onde nunca tinham estado. Aí
novamente foi feita um fogueira, e a mulher falou:
- Fiquem sentados aí, crianças!
E, quando estiverem cansados, podem dormir um pouco. Nós vamos
cortar madeira e, à noite, quando estivermos prontos, viremos
buscá-los.
Ao meio-dia, Mariazinha dividiu seu
pedaço de pão com Joãozinho, que tinha espalhado
o seu pelo caminho. Então adormeceram, e a noite chegou, mas
ninguém veio buscar as pobres crianças.
Acordaram no meio da noite, e Joãozinho
tentou consolar sua irmãzinha dizendo:
- Espere até que a lua desponte
no céu, Mariazinha, e então eu poderei ver as migalhas
de pão que espalhei e que nos mostrarão o caminho de
volta.
Quando a lua surgiu, começaram a
procurar pelas migalhas, mas nada encontraram, pois os milhares de
pássaros que voam pela região as tinham comido.
Joãozinho disse à Mariazinha:
- Nós ainda vamos achar o
caminho.
Mas não o encontraram. Andaram
toda a noite e também todo o dia seguinte, da madrugada ao
anoitecer, mas não conseguiram sair da floresta. E a fome
aumentava cada vez mais, pois não tinham comido nada a não
ser algumas amoras que encontraram pelo chão. E, como estavam
tão cansados, que suas pernas não podiam mais
carregá-los, deitaram-se debaixo de uma árvore e
adormeceram.
Três dias já haviam se
passado desde a saída de casa. Recomeçaram a andar, mas
com isso, penetravam cada vez mais pela floresta e, se não
encontrassem logo ajuda, acabariam morrendo.
Ao meio-dia viram um lindo passarinho
branco pousado no galho de uma árvore, e seu canto era tão
melodioso que as crianças pararam para escutá-lo.
Terminando de cantar, sacudiu as asas e voou diante deles, e os dois
o seguiram até chegarem a uma casinha, em cujo telhado o
passarinho pousou. Quando as crianças se aproximaram, viram
que a casinha era construída de pão, coberta de bolo
com as janelas feitas de açúcar branco.
- Vamos lá! Falou Joãozinho.
Iremos fazer uma boa refeição. Eu quero comer um pedaço
do telhado, e você, Mariazinha, comerá um pedaço
da janela, pois é doce.
Joãozinho ergueu o braço
e pegou um pedaço do telhado, para experimentá-lo, e
Mariazinha se aproximou da janela, da qual mordiscava pequenas
poções. De repente, uma vozinha gritou lá de
dentro:
- Bolacha, bolachinha, quem belisca na
minha casinha?
As crianças responderam:
- É o vento oeste, o filho
celeste.
E continuaram comendo, sem se
perturbar. Joãozinho, que gostou muito do telhado, arrancou um
grande pedaço, e Mariazinha tirou uma boa parte da janela,
sentou-se no chão e começou a comer.
De repente a porta se abriu, e uma
velha, apoiada numa bengala, arrastou-se para fora. Joãozinho
e Mariazinha levaram tamanho susto que deixaram cair tudo o que
tinham nas mãos. Mas a velha balançou a cabeça e
falou:
- Ei, crianças queridas, quem
trouxe vocês até aqui? Entrem e fiquem comigo, nenhum
mal lhes acontecerá.
Ela pegou os dois pela mão e os
levou para dentro de sua casinha. Ali havia coisas boas para comer,
leite e sonhos com açúcar, maçãs e nozes.
Depois foram preparadas duas caminhas com lençóis
brancos, e nelas as crianças deitaram, com a sensação
de estarem no céu.
Mas a velha estava só fingindo
ser tão boazinha, pois era uma bruxa malvada, que andava à
procura de crianças. E só tinha construído a
casinha de pão para atraí-las. Quando uma criança
estava em seu poder, ela a matava, cozinhava e comia, e isso para ela
era um dia de festa. As bruxas têm olhos vermelhos e não
podem enxergar muito longe, mas têm um faro apurado como os
animais e percebem quando alguém se aproxima. Quando Joãozinho
e Mariazinha chegaram perto da casa, a malvada deu uma gargalhada e
disse ironicamente:
- Esses eu peguei, esses não me
escaparão!
Ao amanhecer, antes das crianças
terem acordado, ela já havia levantado e, quando viu os dois
dormindo tão tranquilamente, com as bochechas tão
coradas, murmurou:
- Serão um bom petisco!
Com a sua magra mão agarrou
Joãozinho, carregando-o até uma pequena casinha e o
prendeu atrás de uma porta de grade. Por mais que o menino
gritasse, de nada lhe adiantava.
Então a bruxa foi acordar
Mariazinha e, sacudindo-a, gritou:
- Levante, sua preguiçosa, vá
buscar água e trate de cozinhar algo de bom para seu irmão,
ele está preso lá fora e tem que engordar. Quando
estiver bem gordo, eu vou comê-lo.
Mariazinha começou a chorar
amargamente; mas era tudo inútil, pois tinha que fazer o que a
bruxa mandava.
Joãozinho comia o que havia de
melhor, especialmente preparado para ele; mas sua irmã não
recebia nada, a não ser as sobras. Todos os dias pela manhã
a velha ia até a casinha e gritava:
- Joãozinho, dê-me seu
dedinho para que eu possa sentir se já está mais gordo.
Joãozinho, em vez do dedo, lhe
apontava um ossinho, e a velha, como não enxergasse bem, não
o percebia, e achava que fosse o dedo de Joãozinho, e ficava
desapontada e se admirava de o menino não engordar.
Após terem se passado quatro
semanas e vendo que Joãozinho continuava magro, sua paciência
esgotou, e a bruxa não queria esperar por mais tempo.
- Ei Mariazinha! Gritou ela para a
menina. Seja rápida e vá buscar água. Estando
gordo ou magro, amanhã vou matá-lo e cozinhá-lo.
Ah, como chorou a pobre irmãzinha,
enquanto carregava a água, e como as lágrimas lhe
corriam pelas faces!
Deus do céu, nos ajude! Implorou
ela. Teria sido melhor se os animais selvagens tivessem nos devorado
na floresta, assim pelo menos teríamos morrido juntos.
- Trate de parar com esse choro, disse a
velha. Nada poderá ajudar.
Bem cedo, na manhã seguinte,
Mariazinha teve que encher um caldeirão com água para
acender o fogo.
Primeiro faremos um pão, disse a
velha. Eu já acendi o forno e já preparei a massa.
Ela empurrou Mariazinha para fora até
o forno, no qual já ardia o fogo.
- Entre, disse a bruxa, e veja se ele já
está bem aquecido, para que possamos colocar o pão!
E, quando a menina estivesse lá
dentro, ela pretendia fechar o forno, para assá-la e depois
comê-la também. Mas Mariazinha percebeu quais eram as
suas intenções e falou:
- Eu não sei como fazê-lo;
como poderei entrar no forno?
- Sua boba! Disse a velha. A abertura é
grande o suficiente; olhe só, eu mesma poderia passar por ela.
A bruxa se aproximou e colocou a cabeça
dentro do forno. Então Mariazinha lhe deu um empurrão,
e ela caiu para dentro do forno. A menina fechou a porta de ferro e a
trancou.
Como a velha berrou! Mas Mariazinha
saiu correndo, e a bruxa malvada acabou morrendo queimada.
Mariazinha foi direto soltar seu irmão
e falou:
- Joãozinho, nós estamos
livres livres, a velha bruxa está morta!
E Joãozinho pulou para fora da
casinha como um pássaro pula da gaiola quando a porta se abre.
Como estavam felizes e contentes, se abraçaram, pularam e se
beijaram! E, como não precisavam mais ter medo de coisa
alguma, entraram na casa da bruxa, onde encontraram caixas com
pérolas e pedras preciosas por todos os lados.
- Estas são bem melhores que as
pedrinhas de cascalho, comentou Joãozinho. E encheu seus
bolsos com tudo o que foi possível. E Mariazinha igualmente se
manifestou:
-eu também quero levar algo para
casa.
E encheu o seu avental.
- Mas agora vamos embora daqui, disse
Joãozinho. Vamos sair logo desta floresta.
Depois de terem andado algumas horas,
chegaram a um grande lago.
- Nós não podemos alcançar
o outro lado, falou Joãozinho. Eu não vejo nenhum lugar
por onde pudêssemos passar.
- Aqui também não anda
nenhum barquinho, observou Mariazinha. Mas lá está
nadando um pato branco; se eu pedir, ele nos ajudará a
atravessar. E então chamou:
Patinho, patinho!
Aqui estão Joãozinho e
Mariazinha.
Nenhuma porta, nenhum caminho,
Leve-nos nas suas costas brancas!
O patinho se
aproximou, e Joãozinho
se sentou nas suas costas e quis que sua irmãzinha fizesse o
mesmo.
- Não, respondeu Mariazinha.
Ficará muito pesado para o patinho, é melhor levar um
de cada vez.
O bom bichinho concordou e, quando
estavam do outro lado do lago e já tinham andado um bom
pedaço, a floresta foi lhes ficando cada vez mais conhecida,
até que avistaram a casa do pai lá longe. Então
começaram a correr, entraram na casa aos tropeços e
caíram nos braços do pai. O pobre homem não
conhecera mais nenhum momento de felicidade desde que tinha
abandonado seus filhos na floresta, e sua mulher tinha morrido.
Mariazinha esvaziou seu avental, e as pérolas e pedras
preciosas rolaram pela casa, e Joãozinho jogava um punhado
após o outro de tudo o que tinha em seu bolso. Todas as
preocupações, então, tiveram fim, e os três
viveram juntos e muitos felizes.
Minha história acabou. Ali vai
correndo um ratinho e, quem o pegar, poderá fazer dele um belo
casaco de peles.