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Mito Nacional O Saci-Pererê Mitos Gerais Mitos Regiões
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Jurupari ama os homens
fortes e as
mulheres fecundas. O espírito de sacrifício é
total. Daí o uso da adabi, a chibata, indispensável nas
festas de iniciação e mesmo nas reuniões
públicas. Instituiu o iacuacua, jejum ritual, antes
das
danças. Deu os quatorze instrumentos, medidos de seu corpo. E
obrigou os tocadores tomar vomitório para executarem a música
que atraía até as feras. O vomitótio ritual, ueenaiua, é também
indispensável. Os
instrumentos são tabus. Proíbe-se a sedução
das donzelas antes que a Lua as deflore (vinda do catamênio),
condena à morte o adultério e regula o choco (ver couvade: Modus / nascimento)
ordenando que o pai do recém-nato
fique em repouso e com alimentação especial durante uma
lua, para que a criança adquira a força que o pai
perderá.
Deu regimento para as festas sagradas. São cinco: 1) Quando uma
cunbanquira (mocinha) for deflorada pela Lua. Haverá
sempre o dabucuri de
fruta, caça ou pesca, festa de fraternidade, entre os membros
da mesma tribo ou vizinhos. Nestas festas as mulheres podem e devem
tomar parte. Usam o adabi, chicoteador e, às vezes,
transformam o dabucuri em orgia. Permite-se o dabucuri depois de
trabalhos grandes, plantios de roçados, derrubas de matas,
construção de casario. Come-se e bebe-se nos dabucuris
a fruta da estação; peixes ou caça em época
são aproveitados. A finalidade social e política do
dabucuri é a aproximação fraternal das tabas nas
alegrias e nas danças. |
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O demônio, o
espírito mau, segundo
todos os dicionários e os missionários, exceção
feita do Padre Tastevin. “A palavra jurupari parece corrutela de
jurupoari”,
escreve Couto de Magalhães em nota (16) da segunda parte do Selvagem,
que ao pé da letra traduziríamos - boca mão sobre:
tirar da boca. Montoia (Tesoro) traz esta frase: - che
jurupoari
- tirou-me a palavra da boca.
O Dr. Batista Caetano traduz a palavra: “Ser que vem à nossa rede, isto é, ao lugar onde dormimos.” Seja ou não corruta a palavra, qualquer das duas traduções está conforme a tradição indígena e, no fundo, exprime a mesma idéia supersticiosa dos selvagens, segundo a qual este ente sobrenatural visita os homens em sonhos e causa aflições tanto maiores quanto trazendo-lhes a faculdade da voz. Esta concepção que poderá ser a que criaram as amas-de-leite, amalgamando as superstições indígenas com as de além-mar, tanto vindas da África como da Europa, não é a do nosso indígena. Para ele Jurupari é o legislador, o filho da virgem sem cópula, pela virtude do sumo da cucura do mato, e que veio mandado pelo Sol para reformar os costumes da terra, a fim de poder encontrar nela uma mulher perfeita, com o que o Sol possa casar. Jurupari, conforme contam, ainda não encontrou, e embora ninguém saiba onde, continua a procurá-la, e só voltará ao céu quando a tiver encontrado. Jurupari é, pois, o antenado lendário, o legislador divinizado, que se encontra como base em todas as religiões e mitos primitivos. Quando ele apareceu, eram as mulheres que mandavam e os homens obedeciam, o que era contrário às leis do Sol. Ele tirou o poder das mãos das mulheres e o restituiu aos homens e, para que estes aprendessem a ser independentes daquelas, instituiu umas festas, em que somente os homens podem tomar parte, e uns segredos que somente podem ser conhecidos por estes. As mulheres que os surpreendem devem morrer; em obediência desta lei, morreu Ceuci a própria mãe de Jurupari. Ainda assim, nem todos os homens conhecem o segredo; só o conhecem os iniciados, os que, chegados à puberdade, derem prova de saber suportar a dor, serem seguros e destemidos. Os usos, leis e preceitos ensinados por Jurupari e conservados pela tradição ainda hoje professados e escrupulosamente observados por numerosos indígenas da bacia do Amazonas, e embora tudo leve a pensar que Jurupari é um mito tupi-guarani, todavia, tenho visto praticadas suas leis por tribos das mais diversas proveniências, e em todo o caso largamente influíram e, pode-se afirmar, influem ainda em muitos lugares do nosso interior sobre usos e costumes atuais, e o não conhecê-las tem de certo produzido mais mal-entendidos, enganos e atritos do que geralmente se pensa. Ao mesmo tempo, porém, tem permitido, como tenho dito mais de uma vez ocasião de observar pessoalmente, que ao lado das leis e costumes trazidos pelo cristianismo e civilização européia, subsistem ainda uns tantos usos e costumes, que embora mais ou menos conscientemente praticados, indicam quanto era forte a tradição indígena. Quanto à origem do nome, aceito a explicação que dela me foi dada por um velho tapuio, a quem objetava me ter sido afirmado que o nome de Jurupari quer dizer “o gerado da fruta” - Intimãã, Iurupari céra onheên putáre o munha iané iurú pari uá. Nada disso, o nome de Jurupari quer dizer que fez o fecho da nossa boca. - Vindo, portanto, de iuru boca e pari aquela grade de talas com que se fecham os igarapés e bocas de lagos, para impedir que o peixe saia ou entre. Explicação que me satisfaz, porque de um lado caracteriza a parte mais saliente do ensinamento de Jurupari, a instituição do segredo, e do outro lado, sem esforço se presta a mesma explicação nos vários dialetos tupi-guaranis, como se pode ver em Montoia, às vezes iuru e pari e às mesmas vozes em Batista Caetano (Stradelli, Vocabulário da Língua Geral, 497-498). A origem tupi-guarani do mito é discutível. Foi divulgado, à força d’armas, no rio Negro, pelos indígenas da raça aruaca, vindos do Norte. É, geograficamente, o mito mais prestigioso, com vestígios vivos em quase todas as tribos. É um deus legislador e reformador, puro, sóbrio, discursador, exigente no ritual sagrado. Jurupari-demônio é uma imagem da catequese católica do séc. XVI. D. Frederico Costa, Bispo do Amazonas, na “Pastorai” (11-4-1909), documento de informação etnográfica, não aceitou o satanismo de Jurupari, de quem expôs os oito mandamentos: 1º A mulher deverá conservar-se virgem até a puberdade; Os indígenas não
adoravam
Jurupari.
O bispo escreveu: “Parece também evidente que houve erro em identificar Jurupari com o demônio”(53). Nenhum demônio possuirá as exigências morais de Jurupari. Stradelli estudou o mito, ouvindo indígenas e assistindo à cena do culto nos afluentes do rio Negro. O reformador instituiu nas cerimônias instrumentos musicais de sopro, especialmente uma longa trombeta de paxiúba, que um som cavernoso e profundo. As mulheres não podem, sob pena de morte, ouvir sequer esse som. Nem os instrumentos musicais, máscaras e outros apetrechos das danças de Jurupari podem ser vistos por mulher e mesmo rapaz não iniciado (Stradelli, “Legenda Dell’Jurupary,” Bolletino della Societá Geografica Italiana, terc. série, III, Luglio e segs., Roma, 1890, Em Memória de Stradelli, Manaus, 1936; Geografia dos Mitos Brasileiros, longo estudo sobre Jurupari; Renato Almeida, “Trombeta de Jurupari”, opus cit., 44-48). |
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Fontes : Geografia dos Mitos
Brasileiros / Luís da Câmara Cascudo. - 2ª ed.
- São Paulo: Global, 2002.
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