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Cabra-Cabriola

Havia uma mulher que tinha três filhos de tenra idade, e saindo sempre à noite para angariar meios de subsistência para eles, recomendava-lhes muito insistentemente, que se prevenissem contra as astúcias da Cabra Cabriola, não abrindo a porta senão a ela própria, cuja voz e toada particular perfeitamente conheciam.
Verta noite, porém, chegado o monstro, bate à porta, e ignorando o acordo estabelecido, pede como se fosse a mãe das crianças, que a deixem entrar, mas falando naturalmente com a sua voz forte, grossa e horrível, nada conseguiu das suas artimanhas, e saiu desesperada bramindo:

Eu sou a Cabra Cabriola,
Que come meninos aos pares,
E também comerei a vós,
Uns carochinhos de nada.

Retrocede depois, oculta-se, e aguarda a volta da mulher, e com semelhante artifício aprende-lhe a toada, e repara bem no metal de voz.
No dia seguinte vai à casa de um ferreiro, manda bater a língua na bigorna, e conseguindo assim modificar a voz tornando-a mesmo igual à da mãe dos meninos. Vem à noite, espreita sua saída e depois, bate à porta cantarolando a conhecida toada:

Filhinhos, filhinhos
Abri-me a porta,
Qu'eu sou vossa mãe;
Trago lenha nas costas,
Sal na moleira,
Fogo nos olhos,
Água na boca,
E leite nos peitos
Para vos criar.

E as pobres crianças na persuasão de que era a sua própria mãe que assim lhes falava, abrem pressurosas e alegres a porta, e inopinadamente acometidas pela esfaimada Cabra Cabriola, são devoradas por ela.

Cabra Cabriola

É uma assombração portuguesa que emigrou e se diluiu no fabulário brasileiro. Pelo seu enredo nada demonstra de regional e mesmo de origem patrícia.

Terrível papão para meter medo aos meninos e contê-los nas suas travessuras. Segundo os nossos contos populares, a Cabra-Cabriola é um horrível monstro, de enormes fauces e dentes agudíssimos, a deitar fogo pelos olhos, pelas narinas e pela boca, e que nas suas excursões noturnas, para dar pasto à sua voracidade, astuciosamente, penetra nas habitações e devora quantos meninos encontra.
A Cabra Cabriola vive nos campos e nós só conhecemos sua estória nas cidades do litoral. Está quase esquecida. A tradição da Cabra antropófaga, dando mil saltos e curvas (cabriola) é documento das terras distantes. A estória, acima descrita, foi recolhida por Pereira da Costa no seu Folclore Pernambucano (pp. 80/81. Rev. Inst. Hist. Bras. , tomo LXX. Parte II. Rio de Janeiro, 1908)


Fontes : Geografia dos Mitos Brasileiros / Luís da Câmara Cascudo. - São Paulo: Global, 2002
Dicionário do Folclore Brasileiro / Câmara Cascudo .- Rio de Janeiro: Ediouro Publicações S.A. sem data.



Cabra Cabriola

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