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Cantando o Brasil



Cantigas Sentimentais
Entre as cantigas sentimentais encontramos: a modinha, que já foi música popular, passou a erudita e hoje é considerada folclórica; e a serenata, que veio para o Brasil com os primeiros portugueses e atualmente existe em algumas cidades do interior, principalmente em Minas Gerais, cantada pelos seresteiros, que saem pelas ruas à noite com seus violões e violas, homenageando amigos ou namoradas.

É uma canção brasileira, de gênero tradicional, quase sempre amorosa. As mais antigas tinham, mesmo, acentuado sabor erótico, e por vezes equívoco.
Gilberto Freire a elas se refere, dizendo-as impregnadas do erotismo das casas-grandes e das senzalas.
Ribeiro dos Santos, que as ouviu em Portugal, no séc. XVIII, diz que eram “cantigas de amor tão descompostas, que corei de pejo, como se me achasse de repente em bordéis ou com mulheres de má fazenda”.

Modinha:
O Violeiro
"O Violeiro" de Almeida Junior
Pinacoteca do  Estado de São Paulo, São Paulo - SP
Rosa colhia sozinha
Lindas rosas no jardim
E nas faces também tinha
Rosas da cor do carmim

Eu perguntei-lhe, ó Rosa,
Qual dessas rosas me dás,
A das faces primorosas,
Ou estas que unindo estás

Ela fitou-me sorrindo
E logo enrubesceu
Depois, ligeira, fugindo,
De longe me respondeu:

Não dou-te as rosas das faces
Nem as que tenho na mão,
Daria se me estimasses
As rosas do coração.

Lord Beckford, muitas vezes citado, tem uma tirada, que bem define as deliciosas modinhas, tão em voga na sisuda Lisboa do tempo de Dona Maria I: “Aqueles que nunca ouviram falar desse gênero de música – diz ele – ignoram as mais feiticeiras melodias, que já existiram desde os dias dos sibaritas. Elas consistem em lânguidos compassos interrompidos, como se a respiração faltasse, devido ao excesso de enlevo, e a alma estivesse ansiosa por encontrar a alma irmã de algum objeto amado. Com um descuido infantil, elas se insinuam no coração, antes que ele tenha tempo de armar-se contra a sua enervante influência: imaginamos estar ingerindo leite, e estamos admitindo o veneno da volúpia no mais íntimo recesso de nossa existência”.
Versos como os de Domingos Caldas Barbosa:

  Eu tenho uma nhanhazinha
  De quem sou sempre moleque;
  Ela vê-me estar ardendo
  E não me abana c’o leque.
exemplificam esse clima erótico das velhas modinhas, que a melodia dengosa, vagamente sentimental, ainda mais acentuava.

Modinha é um diminutivo de moda, tipo mais antigo da canção portuguesa, cuja denominação coexiste, no Brasil, com aquela: moda de viola, moda paulista, etc... Está na índole da língua e na tradição dos compositores esse emprego do diminutivo; o mesmo ocorre com fado e fadinho, polca e polquinha, tango e tanguinho, choro e chorinho, etc... A diversificação entre moda e modinha ocorreu em Portugal no séc. XVIII, logo seguida por uma outra distinção perfeitamente definida: a modinha portuguesa e a modinha brasileira. A esta dizem respeito as restrições moralistas acima referido. Apesar disso, eram cantadas nos melhores salões de Lisboa; e os escritores que observaram a música portuguesa do tempo, sempre destacaram a modinha brasileira, pela qual manifestam preferência. A comparação entre os documentos existentes hoje em dia prova cabalmente essa distinção entre os dois tipos de modinhas. E mesmo no Brasil foram freqüentemente cantadas as modinhas portuguesas, de linha melódica mais singela, estabilidade tonal e modal maior, isto é, privadas daquilo que fazia o encanto das brasileiras e que já era um traço inconfundível de caracterização nacional. Efetivamente, Martius, referindo-se às modinhas brasileiras que ouviu em nosso País, no começo do séc. XIX, diz que elas “conservam integralmente o sabor popular e denuncia de vez em quando o pathos verdadeiramente lírico de poetas quase sempre anônimos”. Outro ponto divergente entre modinhas portuguesas e brasileiras é o canto a duas vozes empregado com freqüência pelas primeiras e nunca pelas nossas.

Nas velhas modinhas impressas, quase sempre o poeta e o compositor ficavam no anonimato. Mas sabemos que os poetas da Escola Mineira tiveram seus versos a miúdo empregados pelos compositores do tempo; até hoje muitas liras da Marília de Dirceu ainda andam, anônimas, na boca dos cantadores de modinhas. Em Portugal o mulato brasileiro Domingos Caldas Barbosa foi o mais afamado dos modinheiros setecentistas. A música, embora, às vezes, composta por mestres de nomeada, era despretensiosa e acessível aos de mais baixo coturno; tanto que Rafael Coelho Machado, em seu Dicionário Musical, publicado em 1842, escreve, no artigo modinhas: “pequenas composições que andam em voga e que qualquer curioso pode compor”.
Com o advento do romantismo e a difusão da valsa, o tipo da modinha se modificou profundamente. A brejeirice primitiva cedeu lugar ao mais derramado sentimentalismo; e a rítmica predominante, binária, característica das velhas modinhas, passou ao ternário, quase constante das peças choramingas de meados do séc. XIX. Os poetas preferidos agora são Gonçalves Dias, Álvares de Azevedo e Casimiro de Abreu. Não têm conta as modinhas publicadas, na época, com os seus versos.

Até então a modinha havia sido indubitavelmente, um gênero tradicional, por mais de um século arraigado aos hábitos burgueses para o povo. Ao seu declínio como canção de bem corresponde a voga crescente que vai tendo nos círculos de seresteiros, cantadores boêmios das cidades. E corresponde, também, a uma nova transformação de sua fisionomia: o abandono dos ritmos ternários para adotar os quatro tempos do schottische, que como dança, se introduzira em bailes e pagodes, determinando um melodismo específico, muito doce, a que recorriam, por fim, não só os pioneiros de festa, como os chorões e cantadores de serenatas. A partir dessa época, pôde a modinha ser contada em nosso acervo folclórico.

Mário de Andrade, em seu excelente prefácio às Modinhas Imperiais, mostra-se surpreso com essa folclorização da modinha. “Dar-se-á o caso absolutamente raríssimo – diz ele – duma forma erudita haver passado a popular? O contrário é que sempre se dá. Formas e processos populares, em todas as épocas, foram aproveitados pelos artistas eruditos, e transformados de arte que se apreende em arte que se aprende”. A argúcia habitual de Mário de Andrade não o enganou; embora com o raciocínio entravado pelo conceito clássico de música popular, ele percebeu o que Carlos Veja veio a estabelecer, mais tarde, como teoria, baseado em seus estudos sobre o folclore argentino: que os fatos folclóricos passam do superior ao inferior: que a música hoje popular já foi, um dia, música das classes 
altas.

A modinha nunca teve estrutura formal fixa. Freqüentemente nas mais antigas, em compasso binário, encontramos modinhas antigas sem essa diferenciação rítmica para concluir: modinhas com introdução ou sem ela; modinhas a duas ou três partes; modinhas terminando com o canto ou confiando ao piano uma frase final. O piano tonal também é variável. Há modinhas sem modulação: geralmente, porém, prevalecem a mudança de tom e a mudança de modo. Mário de Andrade observou, mesmo, casos curiosos em que, contrariando a praxe, modinhas há que se iniciam no modo maior e terminam no homônimo. E assinalou, como tendência mais generalizada, no plano modulatório, a passagem para tom da subdominante, o que é, aliás, um traço perfeitamente característico da música brasileira.
Não são muitos esses traços característicos do nosso folclore musical, que encontramos nas modinhas. Na hierarquia dos gêneros que constituem, elas ocupam um lugar alto, isto é, pouco profundo, mais perto das cidades do que do sertão, dos que têm letras do que dos analfabetos. Levam sempre acompanhamento de piano, imprimiram-se profusamente e muitas das vezes foram escritas por bons músicos, conhecedores do seu ofício. Mas o fato é que o gênero se popularizou e, indiscutivelmente, constitui uma das mais autênticas tradições da música popular brasileira. Dificilmente, hoje em dia, um cantador saberá declinar o nome do poeta e do compositor das peças que constituem o seu repertório. Elas andam anônimas, pelo interior do país; e outras, à sua imitação, vão sendo criadas, sem conhecerem a luz dos prelos. Apesar da aludida escassez de elementos característicos nas modinhas, uma vez ou outra eles podem ser assinalados. Assim, por exemplo, encontramos o típico abaixamento do sétimo grau, em documentos setecentistas, como a modinha – “Prazer igual ao que sinto”, da coleção de Spix  e Martius, o “Eu vi amor pequenino”, das “Canções Populares”, harmonizadas por Luciano Gallet. É a sincopa de semicolcheia, colcheia, semicolcheia, no primeiro tempo da melodia, já se acha sistematizada na modinha “Tive por certa menina”, que é guardada em manuscrito, na Biblioteca da Escola Nacional de Música da Universidade do Brasil (vol. 4002, obra 8, 824). Um estudo exaustivo da modinha, história e estilístico, foi feito por Mário de Andrade, no Prefácio e nas Notas da coletânea que publicou sob o título de Modinhas Imperiais. Como coletânea, além dessa, há um precioso álbum, editado à guisa de suplemento da monumental Reise in Brasilien, de Spix e Martius e intitulado Brasilianische Volkslieder und Indiannische Melodien (seus exemplares são extremamente raros). Coleções importantes de peças soltas encontram-se na Biblioteca da Escola Nacional de Música da Universidade do Brasil e em poder de alguns particulares; os Anais do Primeiro Congresso da Língua Nacional Cantada (S. Paulo, 1938) publicam catálogos muito elucidativos de algumas dessas coleções, que figuram na exposição de Documentos Musicais, realizada por ocasião do aludido Congresso. (L. H.). Luís Heitor Correia de Azevedo (Rio de Janeiro).

Serenata:

É o canto e música instrumental executados ao sereno, ao ar livre, diante da casa de quem dedica a homenagem. Tínhamos as serenatas amorosas, canções e modinhas entoadas à porta da namorada, como também as homenagens sociais, prestadas por um grupo que desta forma significava admiração.
Até as primeiras décadas do séc. XX a serenata era uma instituição social. Nas noites de luar percorria as residências dos amigos, cantando e repetindo ceias, até o amanhecer. Mandava o protocolo que as portas e janelas estivessem fechadas e fossem abertas depois de cantada a primeira modinha. Todo o Brasil conheceu e usou a serenata que de todo ainda não desapareceu. 
Um poeta norte-rio-grandense, Cosme Lemos, denominou seu livro de versos, Um lugar na Serenata, porque fizera versos para ter direito de acompanhar os seresteiros na serra do Martins. 
O pernambucano Silveira Carvalho decidira:

Quem ama para dar provas
Deve três cousas cumprir:
Tocar violão, fazer trovas,
Havendo luar não dormir!
Todos os povos históricos tiveram a serenata. Cantar à porta do seu amor é direito consuetudinário e milenar. 
Bancroft (Natives Races of the Pacifics States, I, 549), falando sobre a remotíssima civilização dos Pueblos e Moquis norte-americanos, informa do costume ritual da serenata, com flauta, como processo normal de conquistar o noivado.
Os romanos amavam a serenata e Horácio alude ao costumes nas Odes II, VII e, especialmente na VII, Ad Asterien.
Os gregos chamavam Paraclausithyron esses cantos diante da porta.
Por todo o séc. XIX parte essencial da produção poética destinavam-se às serenatas.
Obrigatoriamente o único instrumento de sopro nas serenatas era a flauta. Os demais, de cordas, o indispensável violão, os cavaquinhos, às vezes o violino e depois o bandolim, solista, nos intervalos, melo-comentando a modinha.
Ao redor da Maioridade, 1840 em diante, foi o domínio da serenata, e as modinhas e canções dedicadas ao canto ambulatório e noturno são em número infinito.
Todas as cidades, vilas, povoações tiveram suas glórias e possivelmente seus sucessores atuais. Como um testemunho de sua vitalidade, na lua cheia de setembro de 1951, às duas horas da manhã, recebi em Natal, a homenagem de uma serenata, bandolim e violões veteranos, ressuscitando as velhas sonorosas de meio século. (Câmara Cascudo).

Fontes : Folclore Brasileiro / Nilza B. Megale- Petrópolis: Editora Vozes, 1999.
Dicionário do Folclore Brasileiro - Câmara Cascudo, Rio de Janeiro: Ediouro Publicações S.A. sem data


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