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Cantando o Brasil




Cantigas Satíricas

Das satíricas temos o Lundu, que foi dança popular de procedência negra e hoje é usada como canção alegre e crítica. Incluímos também os desafios e martelos, nos quais os contendores se criticam mutuamente até que um deles não consegue superar o adversário e acaba entregando os pontos.

Lundu: 

Quando eu era pequenina
E aprendia o bê-á-bá
Minha mestra me ensinava
O lundu do marruá.

Desafios:

Disputa poética, cantada, parte de improviso e parte decorada, entre os cantadores.
É gênero que recebemos de Portugal e conhecido em todo o Brasil, mantido especialmente no Nordeste Brasileiro, mais no sertão do que orla litorânea.
Os instrumentos de acompanhamento são a viola e a rabeca no Norte, a sanfona, o violão, no Sul, sem que possam fixar preferências. Velhos cantadores do passado, como o negro Inácio da Catingueira, usavam o pandeiro.
O desafio é o canto amebeu dos pastores gregos, duelo de improvisação entre pastores, canto alternado, obrigando respostas às perguntas do adversário. (Charles Barbier, “Une Étude sur les Idylles de Théocrite”, Oeuvres Complètes de Théocrite, ed. Garnier, 33-34, Paris, 1899). São vestígios claros em Teócrito (Idílios V, VIII e IX), Vergílio (Éclogas III, V e VII). A técnica do canto amebeu fora empregada por Homero (Ilíada, I, 604, Odisséia, CCIV, 60). Horácio alude a uma disputa entre os bufões Sarmentus e Messius Cicerus (Sátiras, I, V). Devia ser muito conhecido nas populações rurais, porque Vergílio atesta sua vitalidade nessa região.
Passa a Idade Média, reaparecendo na Europa com os jongleurs, trouvères, troubadours, minnesingers na França do sul e do norte, Flandres, Alemanha, com o nome de disputa, tenson, jeux-partis, diálogos contraditados ao som de alaúdes ou viola, a viola de arco, avó da rabeca sertaneja. Também podia dispensar instrumentos musicais, como se vê num códice do século XIV, o Cancioneiro de Heidelberg, na miniatura guerra de Wartburg
No Cancioneiro Português que pertenceu a Ângelo Colocci, encontrado na livraria do Conde Brancutti, pelos romancistas Molteni e Monaci, há, nas primeiras folhas, um fragmento de poética provençal do século XIV, publicado por Teófilo Braga (Era Nova, 414-420, Lisboa, 1881).
Os cantos mais preferidos dos mestres-cantores alemães era os Wettgesange.
Nos velhos cancioneiros ibéricos equivalem às Perguntas y Respuestas, desafio em Portugal, pallo, payada, payada-de-contrapunto, espalhadas por toda a América, desde o México à Argentina (Luís Câmara Cascudo, Vaqueiros e Cantadores, 125-180. ed. Globo, Porto Alegre, 1939).
Os árabes conheciam o desafio, e a influência é visível na música dos cantadores sertanejos. O desafio na África é uma projeção árabe. 
Como o desafio é, em linha reta, vindo do canto amebeu e este pertencia ao ciclo pastoral, acompanhado pelos instrumentos de sopro, os cantadores do Nordeste cantam o desafio, o velho, o legítimo, o verdadeiro, sem acompanhamento musical. No intervalo entre a pergunta e a resposta executam um pequenino trecho, exclusivamente musical, enquanto um dos adversários prepara o verso seguinte. Noutros exemplos, embora sem o acompanhamento ao canto, fazem ouvir um arpejo no fim de cada verso, jamais coincidindo com a voz humana.
O desafio era, mesmo na capital do reino do Brasil, divertimento típico, indispensável nas festas portuguesas no Rio de Janeiro.
“Já se sabe que houve nesse dia função; os convidados do dono da casa, todos d’além-mar, cantaram ao desafio segundo o costume; os convidados da comadre, que eram todos da terra, dançaram o fado”. (Manuel Antônio de Almeida, Memórias de um Sargento de Milícias, 8, São Paulo, 1925).

Cantoria:
Ato de cantar, a disputa poética cantada, o desafio entre os cantadores do nordeste brasileiro.

“Respondeu Manuel Raimundo:
  Canto, pois não, sim senhor,
  Sou novo na cantoria,
  Mas não temo cantador,
  Depois que me esquenta o sangue,
  Canto seja com quem for”.

  “Umas trezentas pessoas
  Em pouco tempo “afluía”,
  Cada qual mais desejosa
  De assistir à cantoria:
  Cada um interrogava
  Qual dos dois apanharia?”

Trechos da “Peleja de Manuel Raimundo com Manuel Campina” e da “Peleja de Serra-Azul com Azulão”.

Carretilha:
O mesmo que carritia, versos de cinco sílabas usados nos desafios sertanejos.

“Cantador que anda
  Tomando peitica,
  Apanha que fica
  Com a orelha bamba;
  Quando se amocamba
  O ninho desmancho,
  Não acha agasalho,
  Encontra é trabalho
  Pesado e de gancho...”
Marco:
É uma construção imaginária, que os cantadores do Nordeste dizem ter mandado erguer, cheia de armas invencíveis, espécie de fortaleza inexpugnável, com segredos defensivos e forças mágicas, a que ninguém poderá resistir. Os velhos cantadores de outrora, no embate do desafio, descreviam os assombros do marco, cabendo ao adversário, no ímpeto da improvisação, desarmar o arsenal, num combate de viva imaginação:
Eu vou contar uma história,
Quem quiser preste atenção,
De um marco que eu levantei
No centro do meu sertão,
Sobre os desertos dum ermo,
Pra dividir meu quarteirão.
.................................................

Vou assentar o meu marco,
Deixar minha divisão;
Ó meu Deus, dê-me um talento,
Igual vós deste a Sansão!
Dê-me ciência pra obra
Igual a rei Salomão!


Mandei bombear o marco
Com 1200 cano.
Todos do mesmo modelo
Dum canhão americano.
Até com outra nação
Nós já temos munição
Para brigar quinze anos.
............................................
Saiba Deus e todo mundo;
Meu marco está assentado
Com orde do imperadô
Licença do delegado!
Com dez légua de distança,
Meu ronco é diferençado!...
(Leonardo Mota, Violeiros do Norte, 82-83, 96-97, São Paulo, 1925).

Parcela:
Fórmula poética entre os cantadores do Nordeste do Brasil, muito empregada nos grandes “desafios”, que se tornaram famosos. A parcela pode ter 8 a 10 versos, tendo os nomes de parcela de 8 e de parcela de dez respectivamente. A fórmula é sempre ABBAACCDDC e na parcela de oito o primeiro verso é livre, ABBCCDDC. A mais típica e preferida é a parcela de dez, onde há deliciosos exemplos de remoque e viva imaginação (Vaqueiros e Cantadores, Porto Alegre, 1939).
Eu dou-te uma surra,
Quebro o espinhaço,
E não me embaraço
Com coisa tão pouca.
Te escangalho a boca,
Não te deixo um dente,
Moleque indecente,
Te ajeita comigo,
Que estou no perigo.

Estou no perigo,
Sou renitente,
Te ajeita comigo,
Cantor indecente;
Não te deixo um dente
Escangalho a boca, 
Com coisa tão pouca
Eu não me embaraço,
Eu dou-te uma surra,
Quebro o espinhaço!

Aquilo que digo
Tu estás dizendo,
Pelo que estou vendo
Estou cantando só...
É muito melhor
Que você se ajeite
Você se endireite,
Que estou zangado, 
Moleque safado,
Você me respeite...

Você me respeite, 
Moleque safado,
Que estou zangado, 
Você se endireite;
É bom que se ajeite,
Eu acho melhor
Eu ir cantar só, 
Pelo que estou vendo
Você sai perdendo
Você me respeite...

Vai minha Parcela
Muito apreciada
Não sendo cansado
Gosto muito dela.
Se torno mais bela
Assim desse jeito.
Sou cantor perfeito
Pra qualquer sala
Só com escala
Tu estás satisfeito!

Vamos Francalino,
Endireite a goela
Você na Parcela
Pra mim é menino!
Perdes o destino
Da tua morada.
Não sabe a estrada
Por onde chegou;
Meu chiqueirador
É teu camarada!

Peleja:
Luta poética entre os cantadores sertanejos, desafio cantado, o debate de improviso.

Eu achei ser desaforo
De um cantador xerém,
Andar fazendo pelejas
Sem as ter tido com alguém;
Segui pelo rastro dele
Fui o pegar no Belém

Eu gosto de ouvir pelejas
Sendo bons os cantadores
Porque depois tenho assunto
Para contar aos leitores;
Prefiro uma cantoria
A ouvir histórias de amores.
(trechos da Peleja de Antônio da Cru com Antônio Tomé e da Peleja do João Piauí com José da Catinguera).


Mourão:
O mesmo que trocado, tipo de versos usados na cantoria sertaneja. Há de cinco e de sete pés, os mais usuais. São dialogados e difíceis, obrigando a resposta imediata do outro cantador, dentro de rimas já escolhidas e limitadas. Um mourão ou moirão, de cinco pés:
A) – Vamos cantar o mourão,
B) – Prestando toda a atenção!
A) – Que o mourão bem estudado
         É obra que faz agrado
         E causa satisfação.
Os cantadores José Siqueira de Amorim (cearense) e Lourival Bandeira Lima (alagoano) cantaram na casa de Câmara Cascudo, na noite de 23 de maio de 1949, um mourão de dez pés, obrigando a enunciação de números. Siqueira de Amorim denominou-o “Mourão de Você vai”:
A) – Vou começar um trabalho
          Pra você me acompanhar;
          Lá vai, 1, 2 e 3...
B) – Eu não posso dispensar
         E nisto não me atrapalho,
         Lá vai 4, 5 e 6...
A) – Mas cantando desta vez
         Tu tens de encontrar um pai!
         Você vai!
B) – Se eu cair o povo diz
         Que eu caí foi porque quis
         Se for por dez pés, lá vai!...
Os mourões  e trocados não são tipos comuns de cantoria, e os cantadores usam apenas nas demonstrações públicas de agilidade mental, espécie de apresentação das possibilidades de improvisação no gênero.

Ligeira:
Uma das formas poéticas empregadas durante o desafio. São versos improvisados ou não, monorrimados, num ritmo aceso e vivo. Ocorre às vezes o refrão.
Há exemplos no Nordeste e no Brasil Central (Vaqueiros e Cantadores):

Tanto faz dar na cabeça
Como na cabeça dar...
Sou espinho de jurema,
Pescoço de morruá...
Do Brasil Central (Goiás e Mato Grosso):
E baliá!
Doutro lado grita gente
Sá Dona manda passá;
E baliá!
E se for bonita eu passo
Se for feia deixo lá...

Fontes : Folclore Brasileiro / Nilza B. Megale- Petrópolis: Editora Vozes, 1999.
Dicionário do Folclore Brasileiro - Câmara Cascudo, Rio de Janeiro: Ediouro Publicações S.A. sem data


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