A
enxada, encaibrada a capricho, bem deitada, pesa 3 libras. O cabo tem
quase duas vezes a altura de um homem e foi trazido do Morro Grande,
depois de um dia de procura. É de "maria-mole", tão reto que parece uma
vela. Foi assado ao fogo, antes de ser descascado, em tiras compridas
que pareciam correias. Assim não rachará e resistirá muito mais ao
tempo. Todos o invejam e ele - seu venturoso dono - conta, com orgulho,
desde a saída de casa para a sua obtenção e o seu cuidadoso preparo:
uma história comprida e simples, contada num linguajar próprio, bem
podia ser resumida em poucas palavras. E os outros o aplaudem e dão
valor ao achado: não há dinheiro
que
pague!
Tem
festa. E corre de boca em boca a sua fama, se a tem. Todos precisam
saber o quanto ali se gastou, o quanto ali se divertiu. Sanfona de oito
baixos, todas as noites, violas e desafios, "cocos" e bebidas. O melhor
machadeiro, o melhor enxadeiro, são apontados com distinção e louvor.
Os piores são alvos das críticas mais acerbas, ficam envergonhados
quando se fala em mutirão.
Os
mutirões crescem de importância segundo o volume da tarefa realizada, o
número de homens empregados, dos gastos feitos e da festa havida. Há os
que marcam épocas e se tornam tradicionais. Os há, também, improvisados
e extemporâneos: a cobertura de uma casa, a desmancha da mandioca, a
quebra do milho, o corte do arroz, a apanha do algodão, a arranca do
feijão.
Em
nenhuma outra ocasião trabalha com mais ardor, o sertanejo, com mais
espontaneidade e com mais rendimento. Não importa que o seu trabalho
não seja pago em dinheiro. O que importa é que ele tenha demonstrado o
seu valor, não tenha ficado "atrás" do eito, "encurralado" ou
"encoberto". Assim não será motivo de debiques nem chacotas e nem será
desmerecido. Pode apresentar-se diante da mulher dos seus sonhos sem
constrangimento algum, ao contrário: altaneiro e envaidecido, gozando
do bom conceito dos seus companheiros - no próximo mutirão, lá estará
com a fama conquistada, invejado pelos homens admirado pelas
mulheres ...
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