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Kamakã
Mitos coletados por Nimuendaju

No século XVIII, habitavam os Kamakã pequenas aldeias, no curso médio do rio Pardo e entre este e o rio das Contas. Sua última aldeia, em fins do século passado, situava-se em Catolé, num afluente da margem esquerda do rio Pardo, a 33 quilômetros em linha reta a leste de Itambé.  Em 1938, restava de toda tribo uma única índia velha, de sangue puro, conhecedora da língua e de algumas tradições: Jacinta Grayirá. Dela recebi o material que registro a seguir, coletado no Posto Paraguaçu do Serviço de Proteção aos índios, no sul da Bahia. - A língua kamakã, apesar de algumas semelhanças com a família gê, forma com as extintas kotošó, manyã e "massacará" (?) uma família à parte.
Kamakã
Kamakã
Sol e Lua:

1. Os preás e os caratingas

Em tempos muito antigos, Sol e Lua viviam juntos na Terra. Sol trouxe da caçada um ayó cheio de preás e caratingas. "Meu irmão", disse ela a Lua, péla esses preás!" Tendo Lua pelado três dos animais, disse, repentinamente, ao Sol: "Não é, meu irmão? Depois de pelados esses preás, todos vão fugir!" Mal havia dito isto, os três preás já pelados fugiram. Sol, que já tinha pelado os seus preás, meteu-os outra vez no ayó apertando a boca deste quando os animais quiseram fugir. Bateu o ayó com os preás no chão e matou-os novamente. "Tu és um conversador!", disse ele a Lua. "Agora os teus preás fugiram. Tu não tens fome, não?"
Deu-lhe um preá e alguns caratingas. Naquele tempo, estes tinham o mesmo gosto bom dos carás cultivados. Quando Lua estava comendo os caratingas, disse: "Meu irmão, estes caratingas são muito amargos!" Desde então tornaram-se amargos como são ainda hoje.

2. A enchente

Acabada a refeição, Sol foi ao riacho beber água. Na aguada viu um enorme quelônio deitado.  Sol parou a certa distância e se dirigiu ao animal: "Avô, queiras afastar-te um pouco para o lado, para que eu possa beber água!" Então o quelônio se afastou e Sol bebeu à vontade. Depois apanhou uma folha de patioba, amarrou suas pontas e a levou, cheia d'água, para Lua. Este, porém, disse que a água estava suja e que ia beber na aguada. "Na aguada está deitado meu avô", avisou Sol, "peça-lhe primeiro que se afaste." Lua chegou à aguada e, vendo o quelônio, gritou-lhe: "Sai daí! Estás fedendo e sujando a água!" Mas o quelônio não se mexeu, nem quando ele gritou pela segunda vez. Então Lua, apanhando uma pedra, atirou-a no animal. A pedra fez-lhe um buraco no meio da carapaça dorsal. Imediatamente começou a descer uma chuva tão violenta que tudo ao redor ficou inundado. Lua fugiu, mas a água arrastou-o, morrendo, então, afogado. Acabada a chuva e escoada a água, Sol procurou seu irmão por toda parte, encontrando-o morto e meio coberto de areia. Então recitou uma fórmula mágica e fez Lua ressuscitar.
3. 0 enfeite do pica-pau 

Depois ambos foram para longe. Sol mandou que Lua fosse buscar lenha e fizesse fogo, enquanto ele próprio ia caçar. Encontrou com os pica-paus que tinham um enfeite vermelho na cabeça, feito de fios que ardiam como fogo. "Avô", disse Sol, "dá-me um novelo dos teus fios!  Necessito dele para amarrar minhas flechas!" "Sim", disse o pica-pau, "mas trazes primeiro lama, meu neto! Muita lama, bastante, para que possas apagar o fogo com ela, senão serás queimado!" Então Sol trouxe, do riacho, um monte grande de lama. Os pica-paus deitaram dois novelos para baixo e o Sol jogou lama no fogo até apagá-lo. Sol foi para casa e 1á deu um dos novelos a Lua.  Lua, porém, não ficou satisfeito com o presente e disse que ia, em pessoa, buscar mais fios. Por mais que Sol procurasse dissuadi-lo, procurou os pica-paus, os quais também lhe ordenaram que trouxesse, antes de tudo, um monte de lama. Lua, porém, teve preguiça e só trouxe um pouco.  Quando, então, o pica-pau atirou o novelo ardente, Lua procurou em vão apagar o fogo com a pouca lama que trouxera, e o fogo o queimou. Assim o achou Sol quando, depois de algum tempo, foi à sua procura. Ele o ressuscitou por meio de uma fórmula mágica; mas, desde então, Lua tem o rosto queimado
4. 0 roubo das flechas

Sol e Lua não tinham mais flechas. Então Sol foi à aguada de uma aldeia. Pôs três pedaços de casca de pau, um por cima do outro, nas próprias costas, e transformou-se em capivara. Depois esperou até que veio uma mulher buscar água. Esta, ao avistar o animal, gritou: "Gente! Uma capivara! Vinde matá-la!" Logo, todos acorreram ao local com suas armas, atirando flechas no animal, mas estas não varavam as três cascas do seu dorso, que eram de pau-d'arco. A capivara saltou n’água, mergulhou e emergiu novamente, e todos atiraram-lhe flechas, cobrindo-lhe completamente o corpo. Então ela mergulhou e, nadando, levou as flechas. Longe da aldeia, Sol tomou outra vez a sua forma primitiva, de homem. Puxando as flechas da casca de pau, fez com elas dois grossos feixes, um para si mesmo e outro para Lua, aconselhando a este que se desse por satisfeito com o presente. Lua, porém, teimou em querer, ele mesmo, ganhar flechas também. Foi à aguada da aldeia e, se bem que Sol o tivesse avisado que pusesse pelo menos três pedaços de casca de pau nas costas, achou que um só era suficiente. Depois, transformado em capivara, ficou sentado. Os homens chegaram com suas armas e as flechas, varando a casca de pau, mataram Lua. Abriram-no e esquartejaram-no, moqueando-lhe os pedaços. Sol fez conjeturas de toda espécie, formando planos para salvar o irmão. Por fim, transformou-se em um beija-flor e, chilreando ao redor do moquém, agarrou um pedacinho do tamanho de um dedo e voou com ele. Com isso, ressuscitou o irmão; repreendeu-o bastante por causa de seu mau comportamento, ameaçando abandoná-lo, caso não se corrigisse.

5. Lua na caverna 

Depois os dois foram caminhando juntos. Estava chovendo fortemente e sem interrupção. Acharam uma caverna num rochedo e nela se abrigaram do temporal. Então Lua, o falador, disse: "Meu irmão, parece-me que esta caverna vai se fechar!" Mal havia falado, as pedras se uniram diante da entrada, ficando os dois presos. Sol, porém, transformado em mucuim (pequeno carrapato), conseguiu escapar por uma fenda, mas Lua ficou preso na caverna.

Ilustrações de viagem: Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil / Jean Baptiste Debret. São Paulo: Círculo do Livro S.A. s. data.

Fonte: Os Mitos / Curt Nimuendaju in  Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional .  nº 21 / 1986 - Fundação Nacional  Pró-Memória / Secretaria do Patrimônio e Artístico Nacional (SPHAN) Ministério da Cultura


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