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Volta para Modus
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A prática
de utilizar aves domésticas como bonecos bem como o uso do bodoque
e do alçapão para pegar passarinhos e depois criá-los
são tradições que permanecem na infância brasileira.
Essa característica também é comentada em 1847, por Fernão Cardim (1925, p. 155), quando se refere às brincadeiras indígenas: |
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Meninos Tukano brincam no rio Balaio - São Gabriel
da Cachoeira, Amazonas
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Tem muitos jogos ao seu modo, que fazem com muito mais alegria que os meninos portugueses: nesses jogos arremedam pássaros, cobras e outros animais, etc., os jogos são mui graciosos e desenfadiços, nem há entre eles desavença, nem queixumes, pelejas, nem se ouvem pulhas, ou nomes ruins e desonestos. O predomínio
de brincadeiras junto à natureza, nos rios, em bandos, é
outra característica do modo de brincar indígena. É
ainda Cardim (apud Freyre, 1963, p. 103) que descreve: |
Cascudo
(1958, p. 83), ao comentar a presença do elemento indígena
nas brincadeiras do menino brasileiro, afirma que em qualquer registro
dos séculos XVI e XVII, sabe-se que os meninos indígenas
brincavam, logo cedo, com arcos, flechas, tacapes, propulsores; enfim,
o arsenal guerreiro dos pais. O divertimento natural era imitar gente
grande,
caçando pequenos animais, abatendo aves menores, tentando pescar.
É que tais brincadeiras não eram mero passatempo como entre
os meninos brancos, mas permaneciam no limiar do trabalho ou na tarefa
educativa de preparo para a vida adulta.
Brincando, as crianças índias aprendem diversas atividades do cotidiano. Koch-Grünberg (1976, p. 135 a 177) relata que o primeiro brinquedo do menino é o chocalho de casca de frutas ou unhas de veado que se amarra a uma boneca. Tão logo passa a engatinhar, brinca no chão com pedrinhas ou pedacinhos de madeira, cava a areia e às vezes põe na boca um punhado de areia e se diverte com um inseto amarrado a um fio. Como todas as crianças, os índios gostam de brincar com animais e insetos. Pouco
depois, quando já anda, ele participa, à sua maneira, da
vida circundante. Koch-Grünberg relata ter visto um indiozinho de
poucos anos de idade brincar de montar a cavalo em seu irmão maior.
Os meninos de mais idade rodam pião.
Entre os taulipáng são encontrados piões que zunem, elaborados em forma graciosa, com uma pequena totuma (fruto) redonda e oca, com uma abertura mais ou menos redonda de um lado. Em ângulo reto é atravessado por um palito de madeira, duro e vermelho, que é fixado com um pouco de cera negra. Variantes de totuma como as que fazem zumbidos não funcionam com cordão. No alto do Rio Negro, são giradas com as duas mãos, em área plana, produzindo um som opaco. Outro brinquedo para meninos é uma matraca, confeccionada com um disco de totuma, com muitas concavidades na borda e uma cavidade no centro, por onde passa um fio, unido nas extremidades. O movimento de virar e esticar o fio produz um ronronar que diverte os meninos. |
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Pião: Foto
Angelo Zucconi
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Pega-moça: Foto
de Angelo Zucconi
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Entre
os wapischana, Grünberg encontra um brinquedo também presente
no alto do Rio Negro, no Amazonas. Trata-se de uma pequena mangueira,
trançada
elasticamente, como uma prensa para mandioca (tipiti). Aberta por um
lado,
a outra extremidade desemboca em um aro trançado e a ele ligado.
Quando se põe o dedo na abertura e se estica a mangueira pelo aro,
esta se contrai e o dedo fica enroscado no trançado. O dedo só
fica livre quando a mangueira se dilata.
Ainda para se divertir, os meninos taulipáng sopram sobre uma folha dobrada, tal como fazem os caçadores para atrair veados. Outro jogo observado entre eles é o enigma. Um pedaço de cana cortado de modo artístico, em três partes independentes, e que somente com muita força se pode separá-las. Grünberg observa entre eles o jogo do fio, hoje conhecido também por cama-de-gato e presente até hoje no rol de jogos tradicionais infantis do Brasil. Muitas vezes as crianças recorrem aos outros para desenroscar os fios ou para tirar um dedo e passar para o outro. Os distintos desenhos que fazem têm todos denominações, lembrando objetos, animais e situações de seu cotidiano. Entre os taulipáng, o autor vê jogos de fios representando: raízes da palmeira paschiuba, entrada da casa, mandíbula de macaco e espelho. Nesta comunidade, apenas as meninas brincam com esta modalidade de jogo.Herbert Baldus (1970, p. 409) observa, também, o jogo de fio entre os tapirapé, tribo tupi, residente no Brasil central, denominado inimá paravuy. Consiste em formar uma multiplicidade de figuras com um fio de algodão. Os xamacóco do Chaco fazem o mesmo jogo, utilizando o polegar do pé os dentes. Entre eles, o jogo do fio não fica restrito às crianças, mas é praticado por todos, meninos, meninas e até adultos. É interessante observar como cada comunidade tem, juntamente com os jogos, crenças que os acompanham. |
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Kissemberth (apud Baldus, 1970, p. 409) observa, em 1909, que vinte figuras foram formadas com o fio, entre os Karajás, e que três das quais são peculiares aos tapirapé. Entre essas figuras estão: tamanduá-bandeira, urubu, libélula, morcego, arraia, piranha, pacu, tucunaré, socó, outro socó sentado no galho com um cipó atrás de si, mandioca, pilão, rede de dormir, flecha, cabana, vigamento de casa, poça seca, lua, céu estrelado, mulher e coito. Esta última figura, de feitio móvel, é reproduzida pela mulher de kamirahó, provocando risos do marido, crianças e dela mesma, mas de forma bastante natural, mostrando o pouco preconceito existente na comunidade com relação às atividades sexuais. Fato que permite aos índios um cruzamento rápido com os primeiros colonizadores portugueses. Os xamacóco formam figuras variadas a que dão nomes de emas, ovo de ema, carnaúba, dois homens em cima de uma palmeira, dois homens em cima de uma algarobeira, morro, rastos de onça, piranha, cama de tronco e lua nascente. Os jogos infantis de algumas populações de zona rural não apresentam o espírito de competição que caracteriza as crianças de zona urbana (Garcia, 1981, p. 193). Mesmo entre os adultos, não há competição, nas situações de jogo. Baldus (1970, p. 409) comenta a ausência desse comportamento nas corridas dois a dois, na festa indígena denominada apachirá. Apesar do esforço manifesto pelos participantes, após o término da contenda, há apenas uma troca de sorrisos, típica dos jogos de movimento. Os meninos tapirapés gostam de fazer correr uma argola de tamankurá, com auxílio de um bastão. Assim, vão de um lado para outro, sem nunca, porém, lhes ocorrer fazer uma competição ou brincar de arremessar a argola e apanhá-la no ar. Del Priore
(1991, p. 20) observa, também a presença dessa brincadeira
de rodar argolinhas entre os indígenas catequizados pela Companhia
de Jesus, em 1550, no Brasil. São
muito apreciados pelos indígenas jogos de grupos imitando animais.
Entre os preferidos estão, segundo Koch-Grünberg (1979, p.
138-139):
1) Jogo de Gavião Consiste em colocar meninos e meninas em fila grande, um atrás do outro, cada um agarrando o corpo do da frente. O menino maior representa o gavião. Este se coloca diante da fila e grita: “piu”, a chamada da ave de rapina que quer dizer: “tenho fome”. Logo, o primeiro dos meninos estende diante uma perna e, depois, a outra, e pergunta: “Quer isto?” Ele contesta: “Não”. E assim segue com os outros, até o último da fila. Ao último menino o gavião diz: “Sim”, e, então, trata de pagar o menino correndo para a direita e esquerda, ao longo da fila. Os demais procuram impedir, voltando a fila rapidamente de um lado a outro, momento em que os menores acabam caindo ao chão no meio do alvoroço. Se o gavião não consegue nada, tem que voltar a seu posto para tentar de novo. Quando consegue, leva triunfantemente o cativo para o lugar que é seu ninho, e prossegue o jogo até que o último tenha sido pego. 2) Jogo do Jaguar Forma-se a cadeia de meninos e meninas como no jogo anterior. O maior representa o jaguar. Apoiado nas mãos e uma perna, com a outra perna estirada imitando o bicho, vai saltando e grunindo de um lado a outro, diante da fila. Os meninos cantam: kaikú si mã gele tape-wai (“este é um jaguar”), movendo a fila de lá para cá. De repente, o menino que representa o jaguar se levanta de golpe e trata de agarrar o último da fila. Os que são pegos passam a representar distintos animais, presas do jaguar, como o cervo, o javali, o jabuti, a capivara e outros. O jogo do jaguar foi posteriormente divulgado pelo Conselho Nacional de Proteção aos Índios, em publicação denominada “Brinquedos de Nossos Índios”, publicada pelo Ministério da Agricultura. 3) Jogo do Peixe Pacu A princípio é como os anteriores. Um menino representa o pescador. Os que tomam parte da cadeia, ao serpentear a fila, cantam: waitá ma-ge lé ta-pe-wai (“este é um pacu”). O pescador trata de correr ao longo da fila e tocar o último menino com um pedaço de cana ou madeira que representa a flecha. 4) Jogo do Jacami Nesse Jogo, as crianças de mãos dadas formam longa fila e vão cantando: ye-matã paná po u’yo-ká la-mã! ta nã yakã i pi zulúz hm-hm-hm (“ao lado do caminho vão correndo os jacamis assustados”). Subitamente, todos saltam o mais rápido possível e voltam atrás. Segundo Aurélio (1975, p. 793), o jacami é a designação comum a várias aves gruniformes da família dos psofídeos, gênero Psohia Crepitans, da região amazônica, cujas penas da cabeça são curtas e retas. Das sete espécies descritas para o gênero, seis existem no Brasil e se adaptam muito bem ao cativeiro, tornando-se autênticos vigias de terreiro ou de habitações de caboclos. 5) O Jogo dos Patos Marreca “wawin” Como
nos anteriores, forma-se uma fila grande, os mais fortes na frente vão
correndo rápido para todos os lados, fazendo “schschwsh
schbschwsch”,
de modo que o extremo posterior da fila se agita e os pequenos caem com
freqüência. De repente, todos param.
6) Jogo do Casamento Muito
alegre e divertido. Frente a uma fila de meninas se encontra uma fila
de
meninos. A primeira menina pergunta ao primeiro menino, indicando sua
vizinha:
“queres casar com esta?” Ele responde: “Não, ela é feia”.
Assim passa por toda a fila de meninas até chegar a última.
Frente a esta o menino responde: “Sim”, e muda de lugar com ela. Depois
se repete a cena. Há muitas cenas engraçadas e risadas. Os vários
jogos envolvendo figuras de animais, sempre colocando em oposição
grupos ou elementos – enfim, jogos que envolvem o pegador – incluem
sempre
a imitação dos gestos, dos movimentos, cantos e grunhidos
dos animais ou aves.
Muito
semelhante ao jogo do jaguar, há um brincado na região central
de Mato Grosso, descrito por Alexandre Moraes de Mello, em Jogos
Populares
Infantis como Recurso Pedagógico de Educação Física,
publicado em 1985. Ali, ele descreve a brincadeira denominada gavião
e os pintinhos, ou também chamada galinha e o gavião.
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