Conhecem
o caminho e não precisam de guia. O cabresto por cima dos
canzais, a cabeça baixa, os passos lentos, mas seguros, remoendo, os
olhos quase fechados numa doce sonolência que o cantar do carro,
rolando atrás de si, embala.
O carreiro impa-se de
contentamento, de orgulho mesmo, numa felicidade sem limites. O mundo
nada, significa para ele senão a força dos seus bois, o seu "cantador"
e todos os seus pertences anexos. Rodas de tamboril manso, braúna ou
jatobá, com meião de grossas almofadas; chedas e cambotas bem ajustadas
nas arreias de pau-d'arco, madeira que serve, também para as outras
peças da mesa; eixo de amargoso, com chumaceiras nos cocões de umburana
macho para fazer o carro cantar sem necessidade de calços, as
cantadeiras de mandioca brava ou árvore-de-São-João. Tudo muito bem
ajustado, muito bem trabalhado, pelo Joaquim Lopes, o mais afamado
carpinteiro na especialidade.
Ontem esteve puxando milho do
roçado, com o carro envarado até as pontas dos fueiros de mucambo. Hoje
vai à vazante, buscar o arroz que os meeiros bateram e vem ensacado em
grandes sacos improvisados com cobertores de riscados, os bitus,
tecidos com fios de algodão, de diferentes cores: branco, marrom e
azul. As duas primeiras obtidas com as cores naturais do algodão:
maranhão e foba e a terceira com a tintura de anil, nativo na região.
Amanhã continuará puxando os milheiros de achas de arueiras, rachadas
de empreitada por João Pretim, com cunhas de ferro, batidas com
pesados macetes de madeira, empilhados à beira do corredor,
para
uma nova cerca divisória. Carreador sinuoso e longo pela mata adentro,
cortado pelo rastro comprido das rodas. Aqui e ali um umbuzeíro,
demorando a marcha do carro se é tempo de umbu maduro que o carreiro
descansa em "S", ou acelerando-a, se está florido e por isso um
martírio para os bois devido à grande quantidade de mutucas que
'agasalha.
Ontem, hoje, amanhã e sempre: "Entra Limoeiro! Fasta Laranjeira!"
|
|